A face mais perversa da crise econômica brasileira continua a pesar sobre os trabalhadores brasileiros. A inflação dos alimentos permanece e a tendência é que se acentue nos próximos meses, conforme estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), pressionando ainda mais a já abalada renda das famílias. A situação também foi constatada pela Fundação Getúlio Vargas, que constatou aumento de 61% no preço do arroz no último ano, ao passo que o preço do feijão subiu 69%.
Os motivos são os mesmos que têm afetado os preços dos alimentos desde o começo da pandemia: demanda interna e externa igualmente aquecidas, atrelada a um efeito cambial que estimula as exportações, já que o real continua desvalorizado. A notícia é boa para os produtores rurais, que continuaram a encher seus bolsos com a safra recorde deste ano, e péssima para as famílias de trabalhadores comuns, com seus orçamentos já bastante apertados pela pandemia.
A pesquisa do Ipea aponta que apenas dois dos 16 itens analisados, que compõem uma cesta de produtos básicos consumidos por todos os brasileiros, podem ficar mais baratos nos próximos meses. Os demais têm tendência de manter o nível atual dos preços ou de aumentar. Ou seja, a alimentação continuará sendo um grande problema para a realidade financeira das famílias brasileiras até, pelo menos, o terceiro trimestre deste ano. Uma mudança só deve surgir com o pior cenário: a queda acentuada na renda das famílias pode vir a diminuir o consumo interno a tal ponto que os preços comecem a cair.
Mas a experiência tem nos mostrado que essa perspectiva dificilmente irá se concretizar, já que a cotação atual da moeda brasileira continua a incentivar as exportações. Além disso, a retomada do crescimento acelerado das economias chinesa e norte-americana tende a aumentar o consumo das commodities, criando ainda mais pressão para valorização destes itens, em especial a soja.
Além disso, a experiência do setor de frigoríficos nos mostra que não dá acreditar que a situação irá melhorar com a simples redução do consumo. A diminuição no consumo de carne bovina, motivada pelos altos preços da proteína nos últimos tempos, acarretou uma crise no setor de frigoríficos, principalmente entre aqueles que não estão habilitados para exportar. O que se segue é a possibilidade de cortes de pessoal e demissões em massa, representando mais um risco à economia brasileira.
O resultado perverso dessa triste realidade econômica já é visível em todo o país. Mais de 116,8 milhões de pessoas estão em situação de insegurança alimentar ou passando fome no Brasil, segundo pesquisa feita em dezembro de 2020 pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan). O número, que é mais da metade do número de brasileiros, engloba pessoas que não se alimentam como deveriam, com qualidade e em quantidade suficiente.